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domingo, junho 22, 2008

Ecologia, da direita à esquerda

Este texto foi escrito por Tom Thomas em 1992 (L`écologie du Sapeur Camembert) e traduzido para português em 1996 (Edições Dinossauro). Passado mais de uma década, não perdeu actualidade, pelo contrário, aplica-se que nem uma luva às práticas do Bloco de Esquerda – justamente o partido que zela pelo futuro do sistema reformista elegendo em Congresso como ponto principal de preocupação a questão do Ambiente – relegando para segundo plano, isto é, aceitando implicitamente, o saque nas periferias sejam eles quais forem os meios empregues para conseguir o equilibrio no centro capitalista, por exemplo, a aplicação de sanções ilegais, o uso da força, a guerra. (que desapareceu do mapa do BE)

“Os ecologistas gostam de repetir que nada têm de comum com os partidos tradicionais, de que se diferenciariam, nomeadamente, num ponto essencial, aos seus olhos: o antiprodutivismo, que não seria de direita nem de esquerda. É uma concepção típica das camadas intermédias, que não se dão conta de que, em política, o “justo meio termo” é um satélite do polo dominante, com maior poder de atracção.
Não só o “produtivismo” não está na raiz dos problemas ecológicos, como o “antiprodutivismo” se limita a uma fórmula vazia. Faríamos o quê? Regressar ao artesanato? Produzir mais moderadamente, preservando a natureza? Deixar de produzir à toa, seleccionando só os bens de “utilidade social”? Mas quem definiria a moderação (quando tantos carecem ainda de tanto), a natureza, as necessidades, a “utilidade social”?
Numa sociedade dividida em classes, divisão que exprime justamente que a massa de indivíduos não são senhores das suas condições de trabalho e estão por isso separados da natureza, sabe-se perfeitamente que essas definições e opções competirão aos poderes do polo capitalista – intelectuais, cientistas, políticos, gestores – os únicos a dispor do seu domínio, que constitui a verdadeira propriedade. De resto, nem esses decidem grande coisa, já que têm por função seguir as instruções dos fetiches: preços, juros, lucros, etc., cujos movimentos e relações guiam a sua conduta com uma precisão semelhante à da cenoura e da chibata para fazer avançar o burro.
A posição “nem esquerda nem direita”, “nem comunista, nem capitalista”, esconde uma realidade bem diferente. Todas as classes sociais têm o seu ponto de vista sobre a ecologia, ou seja, sobre as relações homens/natureza. Todas podem dizer que os desastres ecológicos resultam da actividade humana. Mas nem todas encaram essa actividade da mesma forma, nem a praticam de modo semelhante, nomeadamente quanto ao seu domínio; uns são os remadores acorrentados no porão do navio, outros são os pilotos.
Todas querem renovar a unidade entre o homem e o planeta, mas divergem quanto ao que isso seja, quanto às causas da destruição, quanto ao que deveria ser a humanidade e o planeta.
É verdade que a ala mais radical do movimento ecológico admite que essa unidade passa por uma modificação das relações sociais, tanto nas metrópoles imperialistas como nas relações “Norte-Sul”, e critica a redução da ecologia a um naturalismo. Todavia, esse reconhecimento não vai além de alguns votos piedosos, não chega a assumir a forma de projectos concretos nos programas eleitorais.

Da ala direita do movimento, nem falemos: florescem as mais arcaicas e reaccionárias concepções naturalistas, que o fascismo colocara em lugar de honra, assimilando o homem a um animal movido pela lei da selva e retornando aos mitos pagãos de uma ligação religiosa com as forças obscuras da natureza, os mitos do sangue e da raça. “A terra não mente”, prégava Pétain, exaltando as virtudes da natureza face ao “Mal” da civilização simbolizada pela Cidade corrupta. Sobre este tema, podia tentar captar simpatias, pois estavam em desenvolvimento na época, em reacção contra a miséria humana, toda a espécie de movimentos de regeneração do homem pelo retorno à natureza (aliás, tornados possíveis pelas férias pagas decretadas durante o governo de frente popular de Leon Blum em França): cujas repercussões chegaram cá na forma do escutismo tipo Mocidade Portuguesa, Pousadas da Juventude, a salazarenta FNAT (depois demo-repescada para Inatel), a Colónia Balnear do Século, etc.
Se nos alhearmos desta franja de extrema direita, a grande massa dos ecologistas caracteriza-se, como se disse, por uma concepção reformista típica das camadas médias que querem o capitalismo depurado dos seus “excessos”. O que os une profundamente é essa concepção do interesse geral baseada na ciência como alicerce da racionalidade. Já que os “produtivistas” limitaram a ciência às aplicações técnicas postas aos serviço duma produção desenfreada, os ecologistas vêm moderar estes ardores fundamentando-se em “toda” a ciência, inclusivé a dos ecossistemas e outras biosferas, inclusivé o cálculo económico “completo” que não se limita aos interesses particulares mas toma em consideração os “custos sociais”, o longo prazo: fixar custos à poluição (e à despoluição), tornar os recursos mais caros para estimular a economia”.

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