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segunda-feira, junho 23, 2008

A história do cruzador Maine

Monumento ao Maine
no Malécon em Havana

Quando se fala em operações “false-flag” ou em “inside jobs” normalmente associa-se esses termos a tenebrosas conspirações imaginadas em mentes alucinadas de “esquerdistas”. (no léxico dos interlocutores de José Manuel Fernandes nos eventos do lobie judaico chegou-se mesmo a empregar o termo “kmers vermelhos”). Assim, nada melhor que revisitar episódios que a História consagrou como típicos, ou seja, um conjunto de práticas complexas integradas nas necessariamente redutoras expressões mencionadas. Vejamos como funciona, a fim que se tirem ilacções comparativas com alguns outros casos similares, como seja, Pearl Harbour e o 11 de Setembro, até porque as técnicas não diferem muito dos clássicos empregues há 100 anos.

Existe uma longa tradição de manipulação e de mentiras de Estado, que enxameia a história dos Estados Unidos. Um dos casos mais célebres diz respeito à destruição do couraçado Maine na baía de Havana em 1898, que serviu de pretexto à entrada em guerra dos Estados Unidos contra a Espanha, e à anexação de Cuba, Porto Rico, Filipinas e da ilha de Guam. Esta seria aquela que ficou conhecida como a 1ª guerra Imperialista.

Na noite de 15 de Abril de 1898, pelas 21h,40, o Maine foi de facto vítima de uma violenta explosão. O navio afundou-se quando estava fundeado no porto de Havana e 260 marinheiros americanos desapareceram. De imediato, a imprensa dos Estados Unidos acusou os espanhóis (Cuba era na altura uma colónia espanhola) de terem colocado uma mina no casco do navio e denunciou a sua barbárie, os seus “campos de morte” e até a sua prática de antropofagia...
Esta explosão acontecia na altura esperada. Desde há meses que dois patrões da imprensa rivalizavam na procura do sensacionalismo para levarem os Estados Unidos a intervir em Cuba, onde os insurrectos lutavam pela independência da ilha desde 1895: Joseph Pulitzer, do jornal “World”, e sobretudo William Randolph Hearst, do New York Journal. A campanha era sustentada por homens de negócios americanos que tinham investido muito em Cuba. Todos sonhavam desalojar a Espanha e eliminar os independentistas.
Mas o público americano manifestava pouco interesse por este caso e os jornalistas não mostravam muito mais. Em Janeiro de 1898, o desenhador do New York Journal, Frederick Remington, escreveu de Havana ao seu patrão: “Aqui não há guerra e eu peço para regressar”. Hearst enviou uma resposta que ficou célebre: “Continue aí. Mande os seus desenhos, que eu forneço-lhe a guerra”. E, como por acaso, deu-se a explosão do Maine. Hearst desencadeou uma violenta campanha anti espanhola, evocada em “Citizen Kane”, o filme de Orson Welles (1941).
Ao longo de semanas, dia após dia, consagrou algumas páginas dos seus jornais ao caso do Maine e reclamou vingança, repetindo de forma incansável: “Remember the Maine! Hell with Spain!!!” (Lembrem-se do Maine! Para o inferno a Espanha). Todos os outros jornais o seguiram.

A tiragem do New York Journal passou de imediato dos trinta mil para os quatrocentos mil exemplares, e em breve excedeu regularmente o milhão de exemplares! A opinião pública estava ao rubro e o ambiente tornou-se alucinante. O presidente William McKinley, pressionado por todos os lados, declarou guerra a Madrid em 25 de Abril de 1898. Para maiores lucros da United Fruits e de outros investidores norte-americanos, os Estados Unidos conseguiram facilmente apoderar-se assim de Cuba e das suas riquezas.
Treze anos mais tarde, em 1911, uma comissão de inquérito sobre a destruição do Maine, nomeada pelo Congresso, acabou por concluir ter sido uma explosão acidental na casa das máquinas... A Espanha nada tivera a ver com o caso.

poster da época; os cubanos estão amarrados aos postes da escravatura nas fazendas do açucar, a tropa espanhola persegue-os e fuzila-os, enquanto uma canhonheira norte americana, simbolizando "A Liberdade" aparece providencialmente para os salvar. Sentada no porão, de olhos vendados, está a Opinião Pública embarcada na terra do Tio Sam.

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Em tempos de crise a tropa é sempre uma perspectiva de emprego. Nos Estados Unidos, após a declaração de guerra, 200 mil aventureiros voluntários pegaram em armas e alistaram-se no exército regular, atingindo as forças expedicionárias 55 mil homens.
As esquadras norte americanas destruíram a frota espanhola do almirante Cervera ao largo de Cuba a 3 de Julho. Seguidamente os contingentes desembarcaram nas Filipinas, em Cuba e Puerto Rico. A sua progressão, contra populações e soldados em estado bastante empobrecido, assemelhou-se a pouco mais que um desfile em parada militar. Em dez semanas, na guerra contra Cuba, os Estados Unidos tiveram 400 baixas em combate e 4.600 mortos causados por doenças epidémicas. Ao mesmo tempo, na invasão das Filipinas, a última grande colónia espanhola, não perderam um único homem. Depois do triunfo americano, a Espanha, mergulhada numa enorme instabilidade política, aceitou as condições de paz impostas pelo presidente McKinley. A 12 de Agosto de 1898 aceitaram um armistício, assinando a paz consignada pelo Tratado de Paris, quatro meses depois dos factos que se consagrarão como o fim da sua epopeia marítima colonial. O paradigma mudava, outro género de dominação nascia,

o Império de Xanadu construído pelo 4º Poder: o Negócio das Notícias!
Citizen Kane (trailer 9 min.19 seg.)

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