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quinta-feira, julho 12, 2012

o caso da Dívida da Argentina

Do ensaio radical do neoliberalismo à bancarrota. A experiência económica neocolonial que aconteceu na América Latina na época do pátio das traseiras norteamericano”, chega actualmente à periferia da Europa. Do opúsculo "Viver em Dividocracia, Quem deve o quê a quem?" respiga-se e traduz-se aqui o capitulo sobre a dívida da Argentina. Normalmente este é apresentado como um caso modelo, exemplar. Mas por detrás da aparente ousadia de recusar pagar uma parte da dívida externa, os governos neo-peronistas dos Kirchner faziam acordos com a administração Bush no sentido de aprovar a nivel interno leis de repressão decretadas no interesse geral do Imperialismo.  


Em finais de 1975 a dívida argentina ascendia a 7.800 milhões de dólares, e cada argentino/a devia 320 dólares. Com a ditadura da junta militar a dívida aumentou 465%, até aos 1.500 dólares por habitante. O endividamento foi paralelo à imposição do modelo liberal a sangue e fogo, que destruiu a economia de um país medianamente industrializado e com índices de desenvolvimento aceitáveis. Foi então perpretada uma profunda desregulamentação do sistema financeiro, a obrigação de endividamento desnecessário das empresas públicas, o endividamento de empresas privadas e, finalmente, a assumpção dessas dívidas privadas como públicas por parte do Estado. Tudo isto conduziu à explosão da dívida, que pode ser qualificada por inteiro de odiosa. A crise da dívida nos anos 80 afectou também a Argentina, quando passou a ser democrática. A partir daí o FMI interveio com o seu “Plano de Ajuste Estrutural”. Sob a batuta do que é conhecido como Consenso de Washington impuseram-se cortes sociais, privatizações, venda de património público e, finalmente, a convertibilidade da moeda (o peso argentino passou a valer um dólar norte-americano) perdendo a Argentina a sua soberania monetária. Apesar do “resgate” e da “ajuda” a dívida continuou a crescer vertiginosamente até aos 147.000 milhões de dólares em finais dos anos 90. Em Dezembro de 2001 o governo argentino caiu no meio dos protestos generalizados, pelo aumento do desemprego e pelo colapso do peso (que ninguém acreditava já equivaler ao dólar). O sistema bancário desmoronou-se e as contas bancárias foram congeladas (o que ficou conhecido por corralito). Mais de metade da população tinha caído em patamares abaixo do limiar de pobreza. Tudo isto marcou o final de uma experiência económica que, até havia poucos anos antes, tinha sido considerada como um orgulhoso exemplo do êxito do mercado livre e do paradigma neoliberal (1)

Depois do estalar da crise, a Argentina continuou a negociar com o FMI um pacote de resgate que ajudasse â recuperação económica. Sem dúvidas, o FMI continuou a recomendar as mesmas politicas danosas. A Argentina respondeu com um rotundo Não! ao FMI e anunciou uma moratória unilateral sobre o reembolso da sua dívida externa. Ou seja, deixou de pagar e rompeu com todas as regras (2). O prognóstico dos especialistas foi de depressão e definhamento económico porém o resultado foi precisamente o contrário (3). Do default da dívida resultou a chave que possibilitou a recuperação económica do país. O governo não só passou a dispôr dos recursos necessários para isso, como até, ao não necessitar de novos empréstimos, se libertou do FMI e da obrigação de adoptar politicas económicas prejudiciais, para contentar antes os mercados e os credores (4).

Pese que o total da dívida continue hoje a ser muito elevado, esta não tem o impacto que tinha há uma década (5). Durante o ano de 2011 a Argentina negociou com o Clube de Paris a re-estruturação de uma parte da dívida sem a presença do FMI, rompendo assim uma norma não escrita das negociações da dívida. O Clube de Paris (6) acabou por aceitar um haircut (redução da dívida) correspondente a uma parte de dívidas ilegitimas contraídas pela ditadura militar. Sem ser nada de radical, (porque toda a dívida é ilegitima por ser contraída pelo conluio dos governos burgueses com o interesse dos credores estrangeiros para sacar juros usurários e comissões) a Argentina é o exemplo de que, no mínimo, exercer o direito soberano de não pagar e não ceder às condições impostas pelos credores pode ser a única saída possivel.


Nenhum banqueiro foi preso ou sequer molestado; ao contrário, para os indignados que protestam, a Argentina da era do casal Kirchner fez aprovar em 2005 no Congresso a legislação anti-terrorista sugerida (e de certo modo imposta) por Bush, que como se sabe se destina principalmente a criminalizar os dissidentes que lutam contra o sistema. A presidente Cristina Kirchner já a fez estrear contra organizações populares
notas
(1) A estranha história de Bush na Crise da Dívida Argentina
(2) O caso levou a secretária de Estado Hillary Clinton a comentar o aspecto fisico da presidente Kirchner, notando “estar extremamente magra com sintomas de sofrer de ansiedade e stress nervoso”. De seguida inquiriu os seus diplomatas no sentido de averiguarem se Kirchner “sofria de alguma doença mental” (Guardian)
(3) “Ya Basta!: la opcion de repudio de la deuda”, por Christian Aid, disponível em Gloobal.Net
(4) “La Deuda Argentina, História, Default y Reestruturación”, Sedes, Buenos Aires, 2005
(5) “Reflexiones desde la Experiencia Argentina para el Debate sobre la Deuda de Portugal, Grecia, Irlanda, España...”, Eduardo Lucita, disponivel no CADTM.Org
(6) Segmentando os credores internacionais
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3 comentários:

Anónimo disse...

Eh pá, até que enfim, alguém explica isto tintim por tintim... nos trinques!

Fada do bosque disse...

Olá Xatoo,

Gostei imenso deste seu post.

Venho pedir desculpa, pois sem querer eliminei um comentário seu, ao fazer isso a mais de meia dúzia de um judeu marado e fundamentalita.

Não... não sabia que o Paulo Morais é da maçonaria. Infelizmente estamos num mundo que imperam os que como o feijão têm duas caras.

Um abraço

Fada do bosque disse...

xatoo,
Já reparou que o seu link ISRAEL já foi eliminado? Diz: page not found...