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quarta-feira, outubro 30, 2013

Greenspan: peço desculpa pelo ligeiro "lapso" que tive e lança milhares de milhões na miséria

Postas 10 questões ao ex-responsável pela Reserva Federal na habitual rubrica da Time Magazine, “Alan Greenspan fala sobre o medo, a repugnância e a sua dança preferida” (sic). Trocado por miúdos, para quem se der ao trabalho de saber ler nas entrelinhas, Greenspan admite tudo o que já sabíamos, que um governo que seja devedor já não é soberano, que o credor torna-se ele automaticamente o soberano. No caso dos EUA do consórcio de bancos privados congregados na Reserva Federal que exigem a privatização da globalidade dos negócios; no caso de Portugal, o devedor é servo do credor imperialista, primeiro do alemão por via do Banco Central Europeu e, em última instância, do imperialismo plutocrata norte-americano, uma vez que "a Alemanha nunca mais foi completamente soberana em momento algum desde o 8 de maio de 1945”, citando a recente frase do ministro das Finanças alemão Wolfgang Schäuble. Fica a tradução da entrevista ao emigrante judeu ucraniano que singrou na alta esfera financeira e mandou nas emissões de dólares por mais de vinte anos.

Tm - Porque deu o titulo ao seu novo livro de “O Mapa e o Território”?
A.Gr- É suposto o mapa ser a moldura conceptual do mundo. O território é o mundo verdadeiro, e este nem sempre é quadrado. Tento representar aquilo que se passou e aquilo que eu não entendi.

Tm - Qual foi a maior mudança de pensamento que teve desde 2008?
A.Gr - A que me mudou (quando o Lehman Brothers colapsou) a 15 de Setembro. As percepções mais básicas que tinha sobre economia baseavam-se na presunção de que os seres humanos seriam racionais, olhando para os seus interesses a longo prazo. O verdadeiro choque que senti foi aquilo a que chamamos “o espirito animal” teria uma certa consistência sobre isso – por outras palavras, você pode demonstrar que o medo é uma emoção muito mais poderosa do que a euforia ou a ganância. Tudo isso mudou completamente a maneira como eu olhava o mundo. Comecei por rascunhar equação sobre equação. Aprendi mais nestes últimos dois anos do que aquilo que tinha aprendido nos últimos dez.

Tm - Então como propõe que se possa medir algo tão irracional como o medo?
A.Gr - Prefiro chamar-lhe “não-racionalidade”. Isso mede-se indirectamente olhando para os “spreads” (1) das taxas de juro, por dois ângulos, o do valor do crédito concedido e o do prazo de maturidade dos títulos. Hoje 30 anos de títulos do Tesouro americano, yelds (2), têm uma produtividade de mais de cinco anos por cada ano, a maior margem da história. Os activos de maior prazo são muito mais recompensados. Isto deveria pressupor uma retoma normal. Mas tal não se verifica, por causa do alto grau de incerteza.

Tm - Sabendo o que sabe hoje, o que teria feito de diferente durante o tempo em que esteve à frente da FED?
A.Gr - Que não é o tipo de activo que interessa, titulos de empréstimo, hipotecas, ou acções (3) – mas sim o seu prazo de duração. Sempre soube que o valor da dívida é importante, e se eu pudesse voltar atrás e recalibrar a minha psique e o completo entendimento de quão tóxico o endividamento é, isso teria dado uma ajuda imensa.

Tm - No seu livro sugere que a forma de resolver a doença da economia é cortar nos benefícios sociais?
A.Gr - Não. Parte do caminho de saída é abrandar a prestação desses benefícios. Mas, muito para minha surpresa, os benefícios sociais estão a congregar muitos investimentos privados e poupanças para essa área (4). Os dados disponíveis são muito claros a esse respeito.

Tm - Vc esteve em funções durante o mandato de quatro presidentes. Quanto prejudicial é haver discórdias em Washington?
A.Gr - Nunca vi a questão desse modo. Claramente, o problema é menor com o Partido Republicano. Se se produzir dossiers que não sejam susceptiveis de um compromisso, não podemos ter leis aprovadas.

Tm - Escreveu que uma das coisas que poderiam ter prevenido a crise seria ter aumentado o capital que os bancos deveriam possuir como reserva. Tinha, ou tem, algum remédio em mente?
A.Gr - Sim – seja o que for que se pense, vai para além disso. O processo crítico é contagioso. Não se pode ter um sistema financeiro com os bancos a fazer tropelias horríveis com as hipotecas, mas se eles estivessem bem capitalizados, todas as perdas teriam sido apenas para os accionistas.

Tm - Nesse caso, mudou a sua oposição à regulamentação dos bancos?
A.Gr - Com certeza! Foi errado. Tem de se regulamentar o sistema. A minha preocupação acerca da regulamentação é que ela pode ser muito mais vingativa do que curativa.

Tm - Sente-se pessoalmente responsável pelo que aconteceu?
A.Gr - Sou responsável por imensas coisas! Algumas boas, outras más. Mas sou realista. Se tivesse actuado de acordo com o que sei hoje, nessa altura teria feito melhor? A resposta é não!

Tm - Lemos algures que Vc gosta de dançar. Tem algum género preferido?
A.Gr - O tango. Mas já não me sinto capaz. Apenas danço fox-trot. Sou eu que arrasto a minha mulher pela pista de dança.

Nota à margem: Greenspan tocou clarinete quando era estudante num conjunto de jazz ao qual pertencia igualmente o grande Stan Getz, igualmente filho de judeus, falecido em 1991. Mais valia que na altura o filho dos judeus do leste europeu Grünspans se tivesse engasgado mortalmente com o pífaro. As pessoas racionais se soubessem o que irão saber amanhã agradeceriam...

Colapso Económico, Fome e Miséria Programadas (Infowars)



Breve tradução de alguns termos da gíria capitalista
(1) "Spread", diferença entre o preço de compra (procura) e venda (oferta) de uma acção, título ou transação monetária
(2) “Yield” é a taxa de rendibilidade anual de um activo. Representa o retorno efectivo de uma obrigação de taxa fixa, tendo em conta o preço a que foi adquirida e a taxa de juros que é paga periodicamente em cada ano que passa.
(3) Companhias de Accionistas detentoras de "Stocks", o capital detido no investimento numa empresa que se reproduz com juros periódicos.
(4) "Crowding out" – o aumento da dívida pública sugere a transferência do investimento para a área das empresas privadas, libertando assim o Estado de gastar recursos que não possui. Em última instância, é o Poder financeiro quem decide quem tem ou não tem, investe, ganha ou perde.
(5) "Economic forecasting" - literalmente "Previsão económica" depois das grandes linhas macroeconómicas estarem previamente definidas, condicionando as "previsões" económicas comuns que são badaladas ´nas televisões e outros meios desinformativos.

1 comentário:

Fada do bosque disse...

O post como sempre está um must, mas a sua conclusão xatoo, foi o melhor de tudo! ahahah!